por José Ribeiro*
As gravuras rupestres do Côa despertaram desde a sua descoberta um enorme interesse por parte dos meios de informação escrita e falada e, muito especialmente, pelas cadeias de televisão nacionais e estrangeiras. Quando em 1994 foram descobertas e anunciadas e no ano seguinte se lutou para que fossem preservadas contra a ameaça da construção da barragem do Côa, não estava apenas em causa a polémica sobre a sua suspensão, mas sobretudo o seu incomparável valor patrimonial.
O ano de 1995 foi decisivo para o reconhecimento internacional e para a defesa do património do Vale do Côa. Nesse ano, a escola secundária de Vila Nova de Foz Côa transformou-se no centro de apoio à luta pela defesa e preservação das gravuras e na plataforma logística por onde passaram inúmeros jornalistas portugueses e estrangeiros, muitos arqueólogos, muita gente com mais ou menos peso político, com destaque para os principais responsáveis pelos partidos políticos. Mas foram sobretudo os jornais diários portugueses e os canais televisivos, designadamente a SIC, que mais se interessaram pelo caso do Côa. Todos eles mantiveram durante meses crónicas semanais e a SIC chegou mesmo a montar “arraiais” na escola e a transmitir em directo durante mais de uma semana. Outros canais estrangeiros, como a BBC ou o canal 2 da Coreia do Sul fizeram também várias reportagens sobre o mesmo assunto.
As reportagens escritas, faladas ou televisionadas sucederam-se a um ritmo exponencial e os telejornais, invariavelmente, abriam com as notícias do Côa. Aliás este fenómeno mediático, por si mesmo, iria servir de estudo no ramo das ciências sociais e humanas.
Por outro lado multiplicaram-se as teses de mestrado e de doutoramento sobre o fenómeno sociológico do Côa, tendo vindo a público um excelente volume da responsabilidade do Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE, Lisboa), sob a orientação da professora doutora Maria E. Gonçalves, com a colaboração de vários docentes deste estabelecimento de ensino superior (O Caso de Foz Côa: Um Laboratório de Análise Sociopolítica, Maria Eduarda Gonçalves (org.), Lisboa, Edições 70, 2001).
Hoje o estudo das gravuras rupestres de Foz Côa faz parte integrante e indispensável de qualquer manual da disciplina de História e tem sido motivo de investigação e de estudo em todos os cursos superiores de História da Arte e de Arqueologia, portugueses ou estrangeiros.
A análise política ou sociológica ou a investigação arqueológica continuam a ser as bases fundamentais de estudo, do qual resultaram inúmeros trabalhos de investigação; mas é sobretudo aos responsáveis pelo Parque Arqueológico do Vale do Côa que se deve a maior e mais especializada investigação publicada sobre o assunto. Uma simples consulta ao site oficial do IGESPAR/PAVC (www.arte-coa.pt/) permite-nos contabilizar mais de meio milhar de referências bibliográficas entre artigos, dissertações, conferências e publicações que provam à saciedade a importância do património do Côa.
Mas são também os canais televisivos e as empresas de cinema e audiovisual que continuam a emprestar ao Côa a sua visibilidade, através de filmes e documentários de pequena e média metragem, entre os quais se devem salientar os seguintes:
“Documentário As Gravuras do Côa, Canal 2, RTP”
“Côa, La Rivière aux Mille Gravures, realizado por Jean-Luc Bouvret, Maud Compocasso, 2001, duração:52m”
“O Vale Sagrado, realizado por Hélio Araújo, Produção de COMSOM, 1995, duração: 60m”
“Côa, La Rivière aux Mille Gravures, 2ª Parte, do mesmo realizador, já rodado e estrear brevemente.”
“Filme/Documentário do Canal 1 japonês NHK, coordenação de Chimoto Yoshio, já rodado e a estrear dentro de meio ano”.
“A Arte Rupestre do Vale do Côa, realizado por Carlos Correia, Produção da Universidade Nova de Lisboa, CITI e IGESPAR, duração 30m”
“As Gravuras e Não Só, Horizontes da Memória, José Hermano Saraiva, Realização Videofono, 2000, duração: 30m”
“Foz Côa, Um Concelho Dois Patrimónios, Canal História, Realizado por José Carlos Santos, 2010, duração 65m”
A importância política, sociológica e cultural da descoberta e da luta pela preservação das gravuras do Vale do Côa contribuiu para melhorar a percepção que os portugueses têm hoje sobre o valor do património cultural e a sua capacidade em gerar desenvolvimento económico. Não foi por puro acaso que a Cultura foi elevada à categoria de Ministério pela primeira vez na história política do nosso país, precisamente em 1995, aquando do primeiro governo do engenheiro António Guterres e não é sem sentido que a História da Arqueologia Portuguesa considera simbolicamente que as siglas A.C. e D.C. poderiam, caricaturialmente, significar “antes do Côa” e “depois do Côa”.
Ainda está por escrever a “verdadeira” história do Côa ao nível da luta política e da sua componente sociológica. Certamente que só o tempo permitirá uma análise mais racional e científica sobre este assunto. O certo é que a “A Batalha do Côa” faz parte integrante da história recente e é indissociável de um estudo global. Hoje o Parque Arqueológico e o Museu do Côa materializam as vontades que se conectaram em prol deste projecto e nada melhor do que o Museu do Côa para arquivar as suas próprias memórias, levando o seu próprio testemunho às gentes vindouras, num processo social e político que, tanto pode ser considerado como um ponto de chegada, provocado pela alteração mental da Revolução de Abril, ou como um ponto de partida para novas percepções sobre o valor inestimável do nosso património colectivo.
Por uma ou por ambas as razões, o Museu do Côa deve preservar a história do Côa, como elemento essencial da sua própria gestação, facto que, incompreensivelmente, ainda não foi entendido pelos responsáveis políticos da tutela
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*membro da direcção da ACÔA